sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Eu preciso do outro, eu preciso de você


Deitei e tive um sonho
Um sonho simples, o meu sonho
Lá o ódio não era uma necessidade e nem era naturalizado
Lá o outro, era somente o outro 

Naquele espaço mental, de modo algum, eu não categorizava o outro
Nesse sonho, a voz do outro era respeitada por ser somente sua própria voz
Era um sonho aonde o outro era somente sua consciência e eu não tentava negar a sua própria construção
Ainda nesse sonho, eu percebia que estar diante desse outro, era estar diante do meu maior desafio, do meu real chamado

Nesse sonho eu percebia que minhas palavras não devem legitimar a negação do outro
Nesse sonho eu percebia a vitalidade de respeitar o limite e a escolha do outro
Nesse sonho eu não via o outro como um inimigo a ser vencido ideologicamente, pois não há vitórias na relação entre as nossas diversidades, assim como não há prazer em impor qualquer tipo de submissão
Nesse sonho eu via a equanimidade de nossas fragilidades, a claridade de nossas imperfeições, a inconsistência de nossa frágil violência

Quando acordei, eu me olhei no espelho e as lágrimas se revelaram
Não chorava por mim, mas pela negação que insistentemente faço desse outro
Chorava, pensando nas inúmeras vezes em que me considerei detido pelo valor da verdade, pela necessidade de ser reconhecido através do poder da submissão sobre o outro, através dos elogios multiplicados, que ocultavam a negação concreta de minha conduta em direção ao que é humano.

Agora o dia está perto de acabar e eu sei, eu sei
Que minhas palavras vazias, podem e devem ser substituídas pelo esforço e pelo compromisso com a face daqueles que me cercam
Não importa o conteúdo imanente à identidade dessas faces
Não importa a conduta intrínseca à manifestação dessas faces

Na verdade nada mais importa do que a materialidade ética da minha consciência, assim como a assunção real de minha responsabilidade
Qual seria essa responsabilidade?
Não sei dizer, pois agora as certezas não importam

Na verdade, aquilo que importa, está na minha existência diante do outro e lá, diante dele, no momento crucial do meu ser aí no mundo, eu verei
Eu verei, que na verdade, a missão que permite o início de nossa autêntica condição humana, é a missão baseada em práticas simples, mais irrevogavelmente frutíferas
Lá, diante dele, poderei ver  a mim mesmo e vendo a mim mesmo, verei a ele do modo como ele tem que ser; um outro em si próprio

Toda vez que eu estiver diante desse momento e que puder mergulhar em mim mesmo, diante do outro, eu verei que é preciso silenciar, ouvir e continuar, é preciso silenciar, ouvir e continuar
Silenciar, ouvir, continuar e recomeçar; silenciar, ouvir, continuar e recomeçar

Eu sei, ainda há tempo para prosseguir
E eu preciso de você, eu preciso prosseguir com você...




terça-feira, 6 de setembro de 2016

Para vencer o inimigo, é preciso amar...

  Transpostos os fatos pertinentes ao momento político atual, aonde de modo irrevogavelmente visível, um conjunto de malfadados pilantras se apossaram do poder, por meio de uma clara proposta de retomada do escrutínio trilhado no passado neoliberal brasileiro, assim como pelos interesses internacionais em questão, se faz indubitavelmente necessária a reflexão sobre a natureza vital do que nos é ameaçador, assim como, do que nos é urgentemente exigido. O Brasil é um país raquítico democraticamente, mas não penso nessa condição pela ordem fisiológica, nem pelo advento do lapso temporal de sua existência, pois aqui do nosso lado, vários países com históricos de vivência colonial já apresentam características muito mais contundentes de práticas e ações dirigidas à emancipação representada pela marca do "pertencimento"; o que considero elementar na noção de "fragilidade" democrática é a forma como a inconsciência sobre os interesses envolvidos em nossa convivência coletiva é estimulada, enrijecida e perpetuada.
     Pensemos: De modo particular, no início da gestão Dilma em 2015, ouvimos de formas específicas e constantes, o discurso da necessidade de realização das chamadas "reformas estruturantes", que possibilitariam a retomada do crescimento; sabe, o que me deixou mais raivoso nesse período de governo, até Abril de 2016, não foi a tal obstrução causada pela  oposição, às pautas dessas reformas dentro da Câmara, pois de fisiologismo, já estou cansado; o que de fato me trouxe a fúria, foi exatamente a forma como o governo de "esquerda", repetindo os mesmos pecados de boa parte da esquerda europeia, rezou e glorificou a cartilha pecaminosa e mortífera do neoliberalismo; reformas trabalhista e previdenciária, já eram aventadas por Dilma, trazendo inclusive resistências de entidades sindicais e trabalhistas. Aplicado o Ippon da máfia conduzida por Eduardo Cunha sobre o poder exercido por Dilma, essas reformas salvadoras, são acrescidas aos ideais terríveis de privatizações e enfraquecimento de tudo que é público e comum.
    Essa simplória observação, me leva a refletir sobre como o cidadão brasileiro é um pequeno rato de laboratório diante das manipulações midiáticas, que por atenderem a uma estrutura de exercício do poder, do qual fazem parte, como bem falara Foucault e anteriormente Nietzsche, aonde a incapacidade de perceber o que está em jogo, é expandida em dimensão quântica e de modo infinito. O brasileiro comum vive falando a mesma coisa e isso prova o quanto a sua alienação é gritante; o que ele fala? Fala sobre corrupção, fala sobre corrupção e fala sobre corrupção; depois fala sobre corrupção, repete discurso sobre corrupção e grita que político é ladrão! Meu Deus, quanto hipocrisia, quando nem fila é respeitada e todo mundo a todo instante arruma uma forma de se safar, pois sempre é importante não ser "otário". Me poupem por favor, pois entre sujeira pública e privada, a única diferença é a terminologia em questão. Para completar, ainda surgem aqueles jornalistas moralistas que ganham ibope exaltando a  natureza do cidadão trabalhador diante do mal da corrupção política, que no tempo atual, seria representa pelo câncer universal chamado PT! isso tudo causa náuseas e o vômito resultante, é fedido e letal.
   Seria possível olhar com um mínimo de lucidez para entender quem é o inimigo de fato? Talvez não sejam pessoas em si, nem partidos e nem muito menos o "sistema", talvez o nosso maior e profundo inimigo seja nossa incapacidade de perceber o "outro", que é o verdadeiro alvo da Democracia. A Democracia se faz na conjunção do que nos é necessário e hoje o que nos é necessário, é confrontar nossa insensibilidade diante do outro. Uma das marcas fundamentais do neoliberalismo é destituir tudo que é comum e coletivo, é elevar até a dimensão mais profunda do caos, nossa percepção sobre o outro, esvaziando sua existência diante do eu. Enfrentar a lógica neoliberal, é acima de tudo, ir em direção ao espectro de uma profunda retomada humanista, aonde não serão partidos e nem bandeiras que nos darão a vitória, mas sim a conjunção cognitiva, corpórea e de alma, pelas mesmas causas envolvidas.
   Precisamos ir às ruas, com esse sentimento, precisamos nos organizar nas escolas, universidades, nas comunidades e todos os meios de resistência social, contra essas malditas reformas e contra a entrega de nossas riquezas e do que nos é comum. Tudo que se fala sobre a Previdência na grande mídia, não passa de uma mentira violenta, tudo que se propõe em termo de modernização das relações trabalhistas, não passa de uma refundação das estrutura escravista de trabalho e da atomização da barbárie perpetuada pela coisificação humana; entregar nossas estatais e nossos bens é dizer que não somos capazes de sermos plenamente autônomos, compactuando com uma estrutura de poder, que despreza direitos e as reivindicações das minorias, é esmagar nossa expectativa amorosa de difusão da Democracia. É necessário tratarmos maduramente e de forma contínua todas essas questões, é necessário nos organizarmos para a resistência, cada um dentro da esfera espacial que lhe couber, pois vencer o Neoliberalismo é praticar um ato de amor e não devemos deixar para amar depois, "pois é preciso amar as pessoas, como se não houvesse amanhã, pois se você para pensar pensar, na verdade não há".
    Eu não um partido, eu não sou a necessidade de um lado, contudo pelo bem da Democracia e pela vitória contra o neoliberalismo, grito bem alto: "Fora Temer, Eleições diretas já", pois o Brasil precisa sair dessa lógica, o Brasil precisa praticar o amor com coragem, o amor em unidade...
    
    

terça-feira, 31 de maio de 2016

O filho de um homem descartável, que se tornou descartável...



Em uma noite morna um menino chora

O choro abafado atrás da parede grossa

As lágrimas se perdem nas vozes extenuadas

No entanto, se houve o som da injustiça

Junto com a última gota da liberdade, sendo derramada em vão


Esse menino era filho de um descartável

Mas o descartável resolveu saltar, saltar para o outro mundo

Esqueceu de seu pobre filho, e só saltou

Saltou para a liberdade


Suicídio, riqueza, ciência

As mãos do filho do descartável agora são rudes

Rudes de tecer apenas o trabalho

E o coração está seco


Em vão, mulheres batem à porta, mas não abrirás

Ficaste sozinho

Sozinho com as guerras, fome e as discussões dentro dos edifícios

Por que chegou um tempo em que não adianta morrer

Chegou um tempo em que a vida se torna apenas uma obrigação, uma ordem


Uma ordem que não será aceita

Pois, ele irá acordar

E quando isso acontecer

Levantará os tapetes e as portas


Será então o pó na sola de suas botas

Será tudo aquilo que não suportas

Mesmo que o medo esteja presente

Medo de ser usado

No amor

No trabalho

Por um homem descartável

Mesmo, eu, já me tornado um descartável


Como vencerá então?

Se ao menos não pode romper o silêncio

Vencer o medo

Nem ao menos roubar um beijo


Hoje aquele menino que chorava e não podia dobrar a esquina

Negar a propina

Matar a fome

Trocar de nome

Tampouco ser um simples homem


Perdeu sua face

Não reconhece esta

Tão triste, tão calmo

Nem os olhos vazios

E os lábios amargos


Não tinha essas mãos sem forças

Paradas, frias e mortas

Não tinha esse coração sem compaixão

Que nem ao menos se mostra

Restou apenas o medo

Seu pai e seu companheiro


O medo dos soldados

O medo das mães

O medo das igrejas

Ele cantará o medo dos ditadores e democratas

O medo da morte e o de depois da morte

E quando ele morrer de medo

Sobre seu túmulo nascerão flores medrosas


Por Júlia Siqueira

sexta-feira, 27 de maio de 2016

O QUE É LIBERDADE?

                                                           
Muito se fala sobre ser livre, mas pouco se discute sobre o que é, de fato, a liberdade. É ter autonomia financeira? Tomar decisões? É poder se expressar da forma que quiser?
O que temos são pontas aleatórias do iceberg que é o livre-arbítrio e nos contentamos com isso. Ninguém é plenamente livre, ninguém pode fazer o que quiser, ir aonde quiser, falar o que quiser.
Temos um roteiro preparado, não por Deus ou pelo universo, um roteiro que a própria sociedade montou para si mesma. Os arquétipos mudam de um grupo cultural para outro, mas sempre existem. Como Carl Jung escreveu O inconsciente individual repousa sobre uma camada mais profunda... Eu a chamo de inconsciente coletivo, parte do inconsciente coletivo é compartilhado universalmente, até sob a comparação de culturas extremamente opostas podemos vê-lo, como exemplo, somos capazes de afirmar que a Tribo Surma, no sudoeste da Etiópia, é tão dotada de crenças e rituais quanto a tribo Cherokee, na América do Norte, ainda que distintas, compartilham da mesma necessidade de misticismos e simbologias.
O dinheiro que ganhamos faz parte de um ciclo chamado economia, você já o ganha sabendo que irá se desfazer, de algum modo, dele. O que você recebe, devolve ao Estado, logo, autonomia financeira não existe, visto que não podemos aplicá-lo desordenadamente, sem pagar impostos, sem sermos submetidos ao consumismo.
As decisões que tomamos são reflexos do que vivemos ou da cultura na qual estamos inseridos. Toda decisão é condicionada pelo que precede dessa lógica. Valores contingentes combinam-se para determinarem que uma ação seja inevitável em adequadas situações e as variáveis nos dão uma falsa sensação de liberdade, quando naturalmente obedecem as leis de causa e efeito.
O próprio corpo não nos dá liberdade, nossos desejos fogem do nosso controle, assim como a genética, a escolha de nascer ou não nascer. O ser humano não conhece o livre-arbítrio integralmente, talvez, diante dele, não saberia nem como reagir, já que estamos acostumados com as regras as explícitas e as implícitas.
Inobstante, assumir a veracidade determinista comportaria admitir um universo detestavelmente premeditado e há certa tragédia nisso, como se nada de original viesse a acontecer na humanidade.
Apesar dos inúmeros arquétipos, ocasionalmente, experimentamos a sensação (ou falsa sensação) de quebrar alguns princípios, o que nos deixa sempre com um efeito colateral de contentamento e autocontrole.
E o que você faria se tivesse liberdade absoluta?


-Thauany Melo

quinta-feira, 5 de maio de 2016

E o Verbo se fez carne

Uma das maiores dificuldades em existir dentro de uma ordem coletiva, é assumir que de fato, não precisamos ser o "um", em si mesmo, mas que podemos ser o "mesmo, no próprio outro"; O eu não precisa ser uma conjunção de singularidades normativas, que se encontram perdidas no universo do individualismo materialista, presente em nossa ordem histórica, mas pode sim, ser uma categoria indefinível, que não está retida no si mesmo, mas projetada constantemente na relação inevitável com o outro, seja esse outro, aquilo que somente precisa ser. 
De fato, desde que nascemos, aprendemos dentro dessa ordem estruturalmente ocidental de afirmação do eu, que nossa vida deverá ser projetada para a consolidação do "si mesmo" e que essa competência em ser esse si mesmo, nada mais é, do que a lúcida existência vitoriosa do sujeito racional e dotado de atributos econômicos; podemos ver nesse momento, que o eu em si mesmo da ocidentalidade, nada mais é do que um invólucro impenetrável das afirmações imutáveis, sagradas e intransponíveis do próprio "si mesmo". Enfim, somos estimulados, nos mais distintos círculos existenciais que a nós nos fora imposto, a estabelecer metas de vida, que se limitem a estar em si mesmo e a pensar esse si mesmo, como categoria insubstituível. Diante desse paradigma do eu para si, me atrevo a refletir sobre o significado prático da expressão cristã, que afirma que o "Verbo encarnado esteve entre nós".
Há muitos anos deixei de compreender a fé cristã como um elemento de meritocracia ou mesmo de esforço em direção aos prêmios divinos; admito que esse processo de amadurecimento não tem sido simples, mas também afirmo que há clareza muito potente em meu interior, que a fé não é algo relacionado ao recôndito de uma condição sobrenatural, pois se assim o fosse, ela seria só uma condição instrumental; é preciso ultrapassar o limite da instrumentalidade, para entender aonde se situa a identidade da verdadeira fé humana e para compreender o que esse ação  de esforço vital tem a nos oferecer para o futuro. Penso que agora seja a hora de refletir nas mais distintas instâncias de nossas convivências em comum, sobre como a fé é uma prática discursiva.
Pensemos: Muitos afirmam que não adianta teorias, quando não se manifesta a prática, todavia eu olho para a realidade de nossa convivência comunal de nossos dias e penso se de fato isso não seria uma miopia habitual, que nos impede de mergulhar na oceano profundo de nossa falência oral e comunicativa. A sociedade brasileira, em especial, escolheu, por inúmeros motivos, que nessa pequena reflexão não seria possível elencar, ser ela mesma, uma prova violenta e horripilante da falta de fé na condição humana e essa falta de fé, não é a fé no homem em si, mas a fé no que o Verbo humano pode produzir. Há uma enorme diferença entre acreditar na entidade humana e acreditar na capacidade mútua de discursividade que pode se manifestar entre os homens, pois o homem é concretamente frutífero, quando entende o poder incontestável da fala, da fala ampla, da fala desimpedida, da fala que não se impõe ao outro, mas que caminha através do outro.
Seria um processo autêntico, se ao invés de soluções arbitrárias e consolidadas, fossemos um conjunto de indivíduos, que se responsabilizam por construir espaços permanentes de diálogos consistentes.  Não é possível se dormir em paz, quando a força motriz de nossa existência social, é a intolerância e o fascismo contínuo. O Verbo precisa habitar em nós, mas não mistificado pelas rigidez das normas morais ou eclesiásticas; o Verbo precisa ser encarnado no vigor de nossas vivências, de nossos entrelaçamentos, de nossas perspectivas pueris de vivenciar a efemeridade do tempo presente e do  futuro que não podemos dominar ou prever. É um loucura sem sentido racional, não compreender que só há uma escolha, mas que ela  não  se dá no  determinismo de um modelo de vida religioso, aonde o Verbo é engessado a preceitos sem fôlego e sem sentido transformador.
O Verbo em nós, é a materialização do prazer em ser, pelo outro, em se encontrar perpetuamente na dependência do outro, é a carne pulsante do amor, que não se restringe a infantis observações sentimentais, mas que se expande em direção à responsabilização em si mesmo, de ser a continuidade da fala; mas que fala é essa? mas que Verbo é esse? não tenho respostas, pois o Verbo não é algo pronto, na verdade o Verbo é o se dar contínuo, é o exercício ético para a totalidade; ele é o compromisso em sorrir quando se sente dor, em ouvir, quando se queria falar, em andar, quando o corpo já não quer mais se mover. Bem, o Verbo ainda está aqui, ele perambula clamando por estar em nós, pois se ele é vivo na carne humana do que somos e se queremos ser mais do que um "em si mesmo", do que um "para si mesmo", que aceitemos ser o Verbo transposto, o Verbo ativo, para que nunca mais sejamos afogados pela negação fascista do Verbo, pela afirmação reacionária, restritiva e punitiva da imposição de um silêncio forçado, de uma indiferença avassaladora.
Há tempo ainda, ainda há tempo, o Verbo está bem aí, mas somente eu e você podemos permitir com que ele encarne; ainda é possível, ainda é possível.
A fé está no Verbo e deixar o Verbo fluir em nós, é a verdadeira manifestação de fé...

sexta-feira, 25 de março de 2016

Que venha o ano de 2018


  Esses são dias representativos de nossa infantilidade democrática, de nossa profunda e quase irrevogável fragilidade auditiva, de nossa clara amnésia histórica e além disso, são dias que comprovam como a nadificação de nossa alteridade, alcançou níveis quase que insuperáveis; enfim, no meio dessa totalizante perda do exercício racional de nossa condição humana, muitas reflexões advieram sobre minha mente e nelas, muitas inquietações interiores se revelaram. Diante de tantas análises que podem ser realizadas em meio ao núcleo caótico da divisão estabelecida pelo momento político atual, decidi refletir algumas questões; não me preocupo com as manifestações que hajam de quem quer que seja, no sentido de adesão ou contrariedade ao que exporei, todavia, não posso me abster do exercício crítico, pois como nos ensinou Hannah Arendt, uma vida ativa, pode ser também uma manifestação permanente de nosso exercício de interpretação do mundo, pois o que adiantaria um ativismo opaco e desorientado, quando em nossa condição humana, o que precisamos é antes de tudo, refletir sobre a natureza do que queremos transformar, assim como daquilo que queremos tão somente confrontar. A missão é sempre buscar a materialidade dialética do diálogo e com isso elencarei três elementos para a reflexão:
1) A semelhança histórica entre as formas de destituição do poder, operadas em 1954 e 1964, se apresentam com todo vigor por meio do processo de controle e propagação midiática dos últimos tempos. Não é uma questão de se escolher ser contrário ou defensor do governo do PT, que aliás é consideravelmente culpado em não avançar na pauta da estratificação do controle oligárquico da mídia brasileira, mas sim em usar o mínimo de nossa inteligência crítica para verificar como a mídia de massa, a que age para coisificar, adestrar e domesticar mentes, tem se mobilizado ferozmente nos últimos dias. 
  Pessoas são insufladas a lutarem contra um inimigo comum, inimigo esse, considerado ser o governo petista, perdendo a capacidade de entenderem o perigo que lhes cerca em serem doutrinadas e arremetidas a agir por meio de uma grande campanha publicitária e midiática, que tem como eixo central, desmobilizar a alteridade do discurso, em vista ao império da totalidade unitária do pensar e da ditadura do olhar. Essa imposição monolítica do discurso, da pretensa culpabilidade pública, é associada ao cancerígeno sentimento histórica das elites e de uma própria classe média, que em considerável medida, nunca entenderam ou se comprometeram com a diminuição real das desigualdades e com nosso legado de exclusão histórica. Elas reivindicam a nobreza da probidade da ordem pública, mas nunca entenderam a dimensão real dos termos "bem comum" e "democracia". 
2) Há muito tempo algo me inquieta em uma figura pública e da mídia brasileira, que é o jornalista da Band, Ricardo Boechat; de fato não me preocupo com seus silogismos variantes entre as críticas deslocadas a eixos diferentes da questão da corrupção no Brasil, até porque tenho um grande apreço por muitos elementos do seu trabalho jornalístico e falo isso de forma sincera; principalmente em relação ao modo aberto como expõe seus pontos de vista e seu ótimo senso de humor, todavia a ideia de que a política pública é um mundo apartado da realidade do trabalhador brasileiro, como se o mesmo fosse uma referência concreta de uma vida em busca do comprometimento ético, me parece um tanto quanto falha. Bem, se fizermos uma análise simples do que nos é corriqueiro e contínuo, perceberemos, em todas as classes sociais e em todas as formas de cor e de ser, que há me nós muito mais do DNA da canalhice, do que se possamos imaginar. 
   São tantos hábitos e condutas que afrontam a prática do esforço ético, que tentar construir divisas mundanas entre o que é feito na esfera privada e pública, me parece ser um reducionismo capaz de auxiliar na obstrução de reflexões mais profundas sobre nossas práticas corriqueiras. Um país depende de formação ética para se tornar uma Nação e depois que uma Nação se materializa, as questões de Estado passam a ter uma outra dimensionalidade. Não acredito em discursos midiáticos que reivindicam probidade tão somente de políticos que só representam a mazela plural de nosso existir ético. Detalhe: Um país não educado, nunca vencerá a corrupção com a punição, pois a punição é elemento posterior à formação. Está na hora de discutirmos nossa formação e não de considerar a "Lava Jato" patrimônio de nossa história. Dar murro em ponta de faca, parece ser o fardo de nosso enfadonho discurso moralizante e supostamente ético, atribuir aos outros nossa responsabilidade no curso de muitos diante das práticas públicas, também demonstra uma pitada de hipocrisia permanente e nos faz girar em torno de um rabo curto demais para ser sentido.
3) Por último, afirmo contundentemente que exite um câncer, advindo do modelo político do nosso país e que tentar mudar personagens de um jogo viciado, é prova de mediocridade intelectiva; sem esquecer é claro, que até o presente o momento não há um motivo real que permita pensar na queda da presidenta e isso falo com plena convicção. Há muitos magoados com o PT e eu entendo a mágoa, mas vou fazer uma pergunta: Afrontar a decisão democrática realizada em Outubro de 2014, é algo legítimo? A Presidente fez o quê para você falar de Impeachment? Não tecerei comentários sobre outras figuras políticas do PT, pois acredito piamente que muitos desse partido, aceitaram sim a correlação com a jogatina política exercida nesse país, mas em relação à presidenta Dilma, o que realmente está em jogo? Seja capaz de me responder e eu ficarei feliz, pois como falei no início do texto, são só meras reflexões que faço.
    Caio Prado afirmara que nosso país não é nada dialético e o nosso saudoso Celso Furtado, assim como Darcy Ribeiro, deixaram suas reflexões sobre o que significou o golpe de 1964. Quantos avanços foram  barrados e trucidados pela marcha da insanidade e do interesse real do capital especulativo, assim como do governo estadunidense, Quantos sonhos se esvaíram nas periferias urbanas, nas entranhas dos sertões e redutos agrários, das populações ribeirinhas, das comunidades indígenas, do negro brasileiro, em nome dos interesses de um modelo neoliberal que só afirma a morte da entidade humana. Sabe, eu concordo que na prática, a gestão PT retrocedeu e se entregou em determinadas situações ao mais do mesmo de nossas mazelas político - sociais, mas ninguém irá me convencer que retirar esse governo nesse momento, fará bem a esse país, pois só nos meus piores pesadelos, o PMDB  e o PSDB costumam aparecer. Só em meus piores pesadelos, o meu país avança por causa de preço de dólar ou por mentiras econômicas do capital especulativo. Eu nunca vi o neoliberalismo, em uma democracia raquítica, aonde não há espaço para o plural, ser capaz de atender as dores dos extirpados de nossa ordem social.
     Que a democracia possa avançar um pouco mais, com a vitória da legalidade e da vontade das urnas, que o PT arque sim, com as consequências de boa parte da perda de seu fundamento ideológico, mas que as reflexões necessárias sejam realizadas e que possamos avançar, não por meio desse discurso mentiroso e enganoso do "crescimento econômico" e do "consumo", pois precisamos ser Nação, precisamos resgatar novos debates e reflexões entre a própria esquerda brasileira. Em nome do poder não se poder criar uma suposta primazia do PT, pois o Brasil é maior que ele e os sonhos de justiça social não se reduzem ao mesmo. Enfim, não aceitaremos mais um golpe à democracia, mas chegou a hora daqueles que lutam pelo progresso social e comunal, se organizarem, dialogarem e se disporem a derrubar a força das presentes e futuras derrocadas neoliberais, pois o que está em jogo, é nossa soberania e ela não pode ser afrontada pelo maquiavelismo do grande capital. Ele existe amigo, ele é cruel e mortífero! Viva ao nosso país e que ele possa ser Nação, viva à vontade popular, viva ao que é justo e que em 2018 possamos, quem sabe, construir novas formas de avanço e de desenvolvimento humano.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

O vazio de uma vida


    O vazio é um tema historicamente importante na dimensão do fluir matemático, todavia é somente, em termos espaciais, uma forma de designação específica, assim como tantos outros termos que de modo mitológico representam todo o real, difundindo uma associação perene e constante entre o real que é fato e o real em sua pura existência descritiva. Assim temos muitas dificuldades em entender que o real é aquilo que permanece a contar sua própria historicidade, enquanto os termos são apenas formas de definirmos nossa comunicação com tal realidade.
   Quando trabalho em sala de aula sobre questões pitagóricas, sempre vivo momentos de crescente harmonia com o riso, diante da perplexidade de muitos alunos ao se depararem com minha negação existencial das descrições matemáticas, contudo não é sobre essa temática que venho abordar, mas sim sobre a forma como não entendemos o significado do termo "vazio" em nossa temporalidade existencial. O vazio não é um nada sobre o nada, mas sim o tudo sobre a causa e isso afirmo considerando que o tudo é a ação totalizante que afoga o fôlego comunal da vida, que ofusca e deteriora a força descomunal do corpo, da alma e da simbiose material e espiritual dessa fusão temporal. O vazio é um caos operante, opressivo e violento, que nada afirma sobre a força da vida, mas que tudo nega sobre a causa de existir.
   Quando penso nas infinitas faces e vozes que percorreram minha caminhada, lembro da causa e logo afronto o vazio, mesmo que não seja a minha vida, dotada de constantes de relacionamentos materiais, pois não é a falta de relação física que afirma o vazio, mas a falta de significação sobre o outro, que tem poder totalitário e destrutivo. Uma vez ouvi uma pessoa dizer que eu teorizava, mas que não me relacionava, contudo depois de alguns minutos de questionamentos, ela não soube falar o que é a relação humana e o que ela concebia como causa do existir humano. Os nossos dias, são violentamente marcadas por redes interligadas de relacionamentos de ordem virtual, mas são cada vez mais fortalecidos pela rede destrutiva da intolerância e da idealidade violenta do desejo de que os outros sejam "os nossos outros".
   A sociedade caótica, que exalta a tecnologia e as obrigações sociais e coletivas, dotadas de sorrisos, beleza e alegrias descartáveis, considera a contemplação sobre o vazio, algo tolo e sem significado; pois bem, quem não entende o vazio que ocupa, nunca compreenderá o significado da vida vazia. A vida não é uma  grande rede de relações, ela não é a quantificação de nossas presenças, a vida é a comunhão consistente e coerente com o outro, mas não um outro obrigatório, dentro de um espaço social qualquer, pois aí o outro é só uma parte física dessa estrutura espacial que ocupamos e isso não é vida, é morte, pois a morte também está no espaço que ocupamos enquanto respiramos, ao não entendemos que o outro não depende do espaço físico, mas sim da gratidão interior de tê-lo como integrante do que permanentemente me revelo dentro do mundo das minhas relações.
    A vida não pode ser um vazio de compreensões sobre a importância da diferença da outro, não pode ser um  vazio de audições, quando interrompemos o valor insubstituível de conceber o diferente; ela não pode ser o vazio de uma imagem que oferecemos ao mundo e nem o vazio de ter que ocupar um lado, seja ele qual for, nas diferentes reflexões e debates que realizamos. A vida não pode ser um vazio e não deve ser; quando vou deitar penso nos nomes, lembro das dores, reflito sobre a minha luta contra o meu próprio vazio e assim, continuo militando, para que até o último momento da minha respiração, eu entenda na minha consciência e coração, que o vazio não pode me seduzir e assim saberei ouvir, ao invés de falar, falar só depois de ouvir, pensar ao invés de agir e agir, por que pude pensar, pensar em mim como um tola e maravilhosa partícula quântica, que assim como a gravidade, muda por contingência, mas permanece interferindo na estrutura da vida, lutando contra o vazio da rejeição sobre a mesma. 
    Quem sabe um dia, entendamos que se decepcionar, por esperar algo em troca, seja um ato tão vazio, quanto não se entregar, por achar que não seremos correspondidos. Não é um jogo de romance, é a dialética da vida, aonde lutar contra o vazio, é militar sempre e sempre, para que em nossa consciência, os outros sejam os outros, outros tantos, que nos dão outro sentido ao outro e nos fazem perceber que o vazio, está no um e que a vida, está na conjunção do "nós".